Essa nossa nova coluna quer tirar a culpa que a gente sente quando isso acontece. Vamos falar de um problema que atinge a muitas mulheres após o nascimento do bebê, a depressão pós-parto, e provar que não é só você que se sente ou se sentiu “esquisita” nessa época.
Vida de Mãe traz o depoimento de Adriana, que conta como superou a depressão pós-parto e que, após dois anos e meio do nascimento da filha Natali, ainda se recupera com a ajuda medicamentos e da psicoterapia. E finaliza com as dicas da terapeuta Márcia Fraga Sampaio, que soube analisar com um olhar de especialista, mas também muito feminino, a situação.
Alguns fatores podem levar a mulher a desenvolver a depressão pós-parto, entre eles: ansiedade ou problemas de saúde na gravidez, um casamento complicado, gravidez indesejada, falta de apoio da família, ser mãe solteira, antecedentes de depressão – inclusive numa gestação anterior - e mães que ficaram hospitalizadas após o parto.
Cerca de 50 a 80% das mulheres têm sentimentos de tristeza após o parto, mas geralmente eles vão embora, mais ou menos, na terceira semana do nascimento. Esta depressão “leve” é conhecida pela expressão americana “blues postpartum”. Esta instabilidade emocional é auto-limitada e acaba espontaneamente. É reconhecida basicamente por um sentimento de tristeza inexplicável, fadiga, inquietação, ansiedade, impaciência, irritabilidade e choro sem razão aparente, que atrapalham as tarefas e responsabilidades da nova mãe. O apoio da família é essencial neste momento.
Mas quando essa tristeza se torna profunda e se transforma em angústia e ansiedade, caracteriza-se numa depressão puerperal ou pós-parto. A depressão pós-parto afeta de 10 a 15% das novas mães. Mesmo sabendo que a depressão pós-parto pode ser prejudicial ao seu bem-estar e do bebê, menos de 50% das mulheres buscam tratamento. Algumas simplesmente não acreditam que estão doentes; outras sentem vergonha dos sintomas que ela apresenta. Fique atenta a eles: choro incontrolável, insônia, alterações de humor, cansaço extremo, perda de memória, desesperança, baixa auto-estima, preocupação excessiva, ansiedade, obsessão, compulsão, alterações do apetite, pouca concentração, sentimento de culpa; e ainda: falta de interesse pelo bebê, medo de machucá-lo ou se machucar e pouco empenho em atividades que antes lhe davam prazer, como o sexo.
Vale lembrar que sintomas assim nos primeiros dias após o parto estão dentro da normalidade. Para que sejam classificados como depressão pós-parto devem começar dentro do tempo de seis meses depois do parto. O tratamento da depressão puerperal pode ter a ajuda da psicoterapia ou se dar através de antidepressivos.
Adriana conta, a seguir, como seu sonho de ser mãe passou por momentos de dor e angústia até que ela pudesse sentir-se realizada ao lado da pequena Natali.
Felicidade e ansiedade
Meu sonho sempre foi ser mãe e sempre acreditei que um dia este meu sonho se realizaria... Antes do nascimento da Natali uma ansiedade enorme me consumia a ponto de só pensar em engravidar. Estava há um ano casada e meu marido ainda não queria...
Depois de um ano e quatro meses de casamento fiquei sabendo que estava grávida! Minha alegria se misturou com mais ansiedade ainda, medo, insegurança e depressão...
Mesmo tendo todo apoio de meu marido que estava se acostumando com idéia de ser pai e de toda minha família, minha gravidez foi repleta "de altos e baixos" em termos emocionais...
Eu mais chorava do que sorria e nem imaginava porque estava sentindo-me daquele jeito!
Afinal eu desejei tanto minha filha...
Depressão
Quando a Natali nasceu tudo piorou. Dedicava-me nos cuidados a ela, mas sentia um enorme cansaço e tristeza - apesar de muita emoção ao ver a rostinho dela e as características que ela tinha. Graças a Deus um recém-nascido saudável.
Minha saúde durante os quatro meses que sucederam o parto esteve frágil. Tive anemia, insônia (dormia de uma a duas horas por noite), mas consegui amamentá-la durante este período. Ela mamava de quatro em quatro horas e dormia a noite inteira. Eu sentia um cansaço enorme, estava irritada, mal humorada e sem ânimo! Foi quando passei duas semanas na cama, muito deprimida...
Consultei minha médica e ela diagnosticou depressão pós-parto. Iniciei tratamento com antidepressivos e tive que parar de amamentar.
Entretanto, apesar de tudo que passei e de todos os sentimentos que permeavam minha cabeça, agradeço a Deus por ter me ajudado durante aqueles meses que demoravam a passar ao mesmo tempo em que "passavam rápido” ao ver a evolução física e mental da minha filha.
Alerta!
Hoje continuo tomando medicação e faço psicoterapia. Minha filha já está com dois anos e seis meses e eu posso sorrir ao ver as peripécias dela. Poder sorrir e me sentir bem foram duas bênçãos!
Faço um alerta às mães e futuras mães: não tenham medo de procurar ajuda de um profissional (obstetra e/ou psiquiatra) caso tenham muita irritação, tristeza, cansaço excessivo, muito medo, ansiedade e insônia antes, durante e principalmente depois do parto!
Palavra do especialista:
Terapeuta Márcia Fraga Sampaio
Conversamos com a psicóloga do Hospital Memorial Faud Chidid, no Rio de Janeiro, e coordenadora do Centro de Pesquisa e Clínica Psicanalítica Laços, Márcia Fraga Sampaio. A terapeuta ressalta as mudanças físicas e emocionais que passamos durante e após a gravidez; fala da importância e da ajuda da família; e do tratamento psiquiátrico e psicológico da depressão pós-parto:
Gravidez
A gravidez é sempre um momento marcante para a mulher. Em nossa sociedade é vista, culturalmente, como um momento mágico, sempre desejado por elas. Entretanto não podemos esquecer que é um momento que traz muitas mudanças ao corpo da mulher, além de mudanças definitivas em sua vida e seu futuro – pois ela terá a responsabilidade de cuidar de um bebê e de sua evolução até que se transforme em um adulto. Isto irá trazer reflexos em todas as áreas de sua vida, seja profissional ou financeira, no relacionamento amoroso ou na vaidade. Enfim, o futuro dela a partir de agora irá sempre se refletir no futuro de seu filho.
A barriga e o sonho
Quando e gravidez é desejada e planejada pelo casal, sua confirmação é sempre vivida com alegria e comemorações. Durante a gravidez a mulher é mimada e rodeada de olhares carinhosos. Mas toda essa atenção está voltada para sua barriga; é como se neste momento ela passasse a ser ‘uma barriga’. De maneira geral vimos que todo o investimento dela passa a ser em torno de seu bebê: os preparativos, os cuidados com sua saúde e a expectativa e fantasias em torno de como ele será (A cara do papai ou da mamãe? Será tímido como o papai ou extrovertido como o vovô? Irá ter os olhos da vovó ou nariz da titia?). Muitos romances imaginários são construídos em torno da espera pelo bebê.
Fantasia e realidade se chocam
Este é um momento em que a mulher se sente plena e completa. Em psicanálise entendemos que esse é o momento em que a mulher se sente a mais perfeita dos mortais; sente-se quase imortal. A ruptura desse estado mágico de plenitude ocorre com o nascimento do bebê e toda a mágica do nascimento se transforma na realidade de um bebê concreto, que nem sempre corresponde a todas as expectativas. Ele deixa de ser um sonho, uma idealização, e passa a ser alguém que chora, faz cocô, xixi, dorme muito ou não dorme, não sabe dizer ou pedir e não vem com ‘manual de instruções’ para que a mãe possa decifrar seu choro e suas necessidades. Junto a isso o corpo da mulher é tocado pela dor, pelo corte, e não volta a ser como antes tão rápido assim. Dizendo de outra forma, fantasia e realidade se chocam trazendo certo conflito que nem sempre é bem absorvido pela mulher. Se ela está bem resolvida em relação ao seu desejo de mãe terá mais chances de continuar revestindo essa realidade com romance e beleza e continuar a viver a maternidade de forma tranqüila. Do contrário, poderá viver momentos de angustia.
Insegurança e medo são normais
Cada mulher tem a sua história: o momento em que a gravidez aconteceu; se foi planejada ou não; sua relação com o pai da criança; sua vivência de maternidade como filha com sua própria mãe, se foi tranqüila ou conturbada; a sua expectativa de futuro; sua disponibilidade de por os cuidados com o bebê como prioridade em relação a sua própria vida nos primeiros meses de vida dele; sua relação com seu corpo e sua vaidade ao vê-lo mudar em função da gravidez; evolução da gravidez e suas interferências em sua vida...Todos esses aspectos irão contribuir ou não para a tranqüilidade da mulher ao receber seu bebê. E esses aspectos serão positivos ou não no equilíbrio emocional da mulher ao lidar com esse momento inicial de ruptura de seu corpo, em que a fantasia de união e completude com seu bebê são quebrados por um corte em seu corpo e um choro de neném. É importante observar a atitude de mulher em relação à gravidez e a expectativa em relação ao parto. Inseguranças e medos são normais, mas se são acompanhadas de alegria e sonhos elas se tornam mais tranqüilas e suportáveis. Quando a mulher começa a sentir tristeza, angustia, insegurança, choro freqüente, sensação de vazio que interferem em sua disposição com os cuidados com o bebê, consideramos como sinais de que ela está precisando de ajuda e atenção especial. A depressão pós-parto pode ocorrer de intensidades variáveis, de maneira sutil ou de forma mais evidente, mais séria.
Depressão pós-parto
A depressão pós-parto resulta de um momento psíquico e emocional de conflito e angustia que interfere na vida da mulher. Uma gravidez num momento mais sereno ou de maior maturidade afetiva poderá favorecê-la de modo a não manifestar tais sintomas e dificuldades. A maternidade traz muitas inseguranças e isto é natural. Essas inseguranças se tornam mais angustiantes para algumas mulheres trazendo conflitos no exercício de seu papel de mãe, o que de alguma forma irá interferir na sua relação e seus cuidados com seu filho. É importante ressaltar que inseguranças, dúvidas e conflitos são naturais e pertinentes ao ser humano. Não é relevante fazer recriminações considerando que houve rejeição em relação à criança. O mais importante é que essa mulher que se torna mãe tenha condições e respaldo para elaborar suas questões emocionais, superando-as e ficando mais livre para curtir seu momento mãe-bebê e possa construir uma relação de confiança e ternura com seu filho.
O resgate da alegria de ser mãe
A procura de ajuda profissional é importante para que ela possa resgatar essa alegria de ser mãe. Recomenda-se o tratamento psiquiátrico e psicológico. A psiquiatria irá contribuir com cuidado medicamentoso e a psicologia irá contribuir com a possibilidade de falar sobre sua própria história, identificando que aspectos interferiram para o surgimento da depressão e poder superá-los afetivamente, reorganizando internamente algumas questões para que se sinta mais tranqüila.
Denise Domingos
Fonte: Guia do Bebê
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